A questão da Venezuela

       Vai ter guerra na Venezuela?

        A pergunta mais comum quando se fala sobre a Venezuela é: vai ter guerra contra o Brasil? A política em si, as relações internacionais, não possuem essa característica monolítica. O que quero dizer com isso? É que na política tudo pode acontecer. Veja o caso das eleições, de dois mil e dezoito, quem ganhou? Jair Bolsonaro, como dizem no turfe, o azarão da campanha eleitoral.
       O que posso comentar é que a situação está tensa. Porque essa "ajuda humanitária" a qual os Estados Unidos da América estão enviando à Venezuela, segundo Maduro, é um Cavalo de Tróia, com finalidade bélica e não humanitária. Não existe um benfazejo anseio ético em engendrar um apoio material aos venezuelanos, o apoio denominado de "humanitário" visa desestruturar a solidez dos adeptos do chavismo e causar uma divergência civil no território venezuelano. Uma tática usada, na última década, de implodir governos eleitos democraticamente através de anti-locução. A anti-locução - conforme Gordon Allport -  é uma forma de discurso de ódio, com finalidades dúbias, que apresenta-se como uma maneira de utilizar-se de um discurso com roupagem democrática porém cuja finalidade em essência é o ódio. Países na Ásia e África, carecem de produtos básicos de consumo (Bens de Giffen) e os Estados Unidos da América não coordenam nenhuma grande ação que objetive erradicar a fome em regiões de pobreza endêmica. Questões humanitárias, sob  a égide do Direito Internacional, deveriam ser mediadas por um mecanismo regulador internacional e capaz de aplicar sanções a  qualquer nação que faça uso tirânico de sua capacidade econômica ou bélica. Não é o caso, pois países que apresentam a desigualdade material (segundo Ehrlich) inferem que a legitimação do poder se dá pelo status quo. No Direito Internacional, a igualdade formal, inspirada na Declaração Dos Direitos do Homem e do Cidadão, é meramente uma evocação de direito mais retórica que aplicável. É a fraqueza da igualdade formal frente  à igualdade material.
         Sinto-me completamente preparado para comentar acerca da Venezuela, pois há algum tempo venho acompanhando os dois pólos de disputa do poder: os Chavistas e os Liberais. A classe média liberal, vendo seu poder definhar ao longo do chavismo, que tenta com o endosso dos EUA derrubar o regime de Nicolás Maduro. 
        Internacionalmente, a classe média representada pelo autoproclamado presidente Juan Guaidó recebe apoio do Grupo de Lima, dos EUA e de vários países da União Européia. A Colômbia tem sido logisticamente fundamental nos planos contra Maduro, pois as cidades de Cúcuta e Tona estão sendo utilizadas para treinamentos militares. Por exemplo, a imprensa de grande massa tende a noticiar que Caracas está sob protestos pró-Guaidó mas na verdade a realidade é outra. Conforme mostrado, nas redes sociais, em tempo real, Caracas está calma e o trânsito flui tranquilamente. 
      Por que citei a imprensa? Porque uma ação política depende da opinião pública, da reação das pessoas, diante de possibilidades bélicas. A imprensa noticiando que a Venezuela está em crise, que centenas de pessoas já morreram de fome, que Roraima abriga cerca de quarenta mil refugiados, constrói uma imagem a qual o presidente venezuelano exerce um governo perverso. Diante de diárias manchetes, noticiando calamidades, o público vai nutrindo-se de ódio. Conjecturando uma possível intervenção militar brasileira, nesta atual conjuntura política, Jair Bolsonaro teria a aprovação da maior parte do povo brasileiro. 
        Lembrei de William Randolph Hearst, fundador do grupo Cosmopolitan e magnata das comunicações. No auge do governo de Adolph Hitler, Hearst absorveu muito das ideias difundidas no Mein Kampf e aplicou-as no seu conglomerado da comunicação. Soube desse fato ao participar de um grupo de estudos, sobre marxismo, em Recife. Inclusive Hearst patrocinou financeiramente a campanha de Hitler nas eleições de 1932. As ramificações do grupo Cosmopolitan influenciaram a comunicação na América Latina toda, sempre difundindo seus valores através do conteúdo oferecido por seus diversos meios. Além disso, durante a ditadura militar no Brasil, o Estado concedeu (quando Antônio Carlos Magalhães  foi ministro das Telecomunicações) concessão de rádio e TV para políticos e pessoas ligadas à aristocracia brasileira. Meio difícil crer que essa imprensa vá contra o neoliberalismo, se são justamente as grandes empresas que compram horário em publicidade.
        Retornando a questão da ajuda humanitária, por que Maduro considera um perigo? Porque não é seguro, militarmente falando, permitir que exércitos de outros países ultrapassem a fronteira. Ainda mais países que estão com divergências políticas e diplomáticas, torna-se perigoso. Maduro também questiona o material enviado, o qual considera como "arma biológica" e que poderia acarretar em danos à saúde do povo venezuelano. Maduro reitera que a Venezuela não precisa de esmola, precisa de relações comerciais sem sanções. A Venezuela está sofrendo sanções internacionais, porque a classe média venezuelana não reconhece a eleição de Maduro, então um tribunal internacional com sede em Washington - com cerca de trinta juízes - declara o governo de Maduro ilegal e endossa que Juan Guaidó é o presidente da Venezuela (no "entendimento" destes magistrados). No entanto, se os EUA quisessem realmente apoiar solidariamente o povo venezuelano, por que não fizeram tal benesse por meio da ONU?  Desde quando um tribunal internacional pode exercer influência na soberania de uma nação estrangeira? Aprofundo esta linha de pensamento, questionando a ausência de um consenso internacional. Há mecanismos regulatórios? Se não há um mecanismo regulador, capaz de impor a coerção a qualquer nação que seja, deixará as potências menores sujeitas ao abuso de superpotências.
        Donald Trump está passando pelo mesmo imbróglio que Margareth Thatcher  passou, em 1982, na Guerra das Malvinas. Foi a Guerra das Malvinas que proporcionou a reeleição de Thatcher, que passava por uma delicada crise de imagem. Trump já está de olho na reeleição, um êxito em guerra traria apoio popular e garantiria a sua vitória  e a dos republicanos. A possibilidade de uma intervenção militar aparenta cada vez ser mais iminente. A Venezuela, conforme prospecção, possui mais petróleo que a Arábia Saudita (além de ouro e diamantes) e isso gera uma nababesca cobiça por parte das superpotências. Vencer uma guerra significaria vencer uma eleição presidencial.
       Militarmente falando, conjecturando paridade bélica, a Venezuela tem uma força aérea muito mais atualizada e operacional com os caças Sukhoi Su-30 e os sistemas antiaéreo  S-300 MV (ambos comprados da Rússia) e em plena operação. Maduro fez exercícios militares, durante o bicentenário do  Discurso de Angostura de Bolívar e mostrou como as forças armadas do país estão alinhadas com ele. O Brasil possui o sistema ASTROS II (atualizado para ASTROS 2020), um dos melhores no segmento e que consegue lançar inúmeros mísseis com precisão no acerto dos alvos (num raio de quarenta quilômetros) e fez um imenso sucesso  na Guerra do Golfo. É uma tecnologia nacional muito bem dominada, no campo da aviação os Super Tucanos também possuem bom desempenho em região de selva. No entanto os Su-30 são outra categoria, não há como fazer comparação bélica com um Super Tucano.
       A entrada da da Colômbia, na OTAN, preocupa porque se houver conflito armado entre a Colômbia e a Venezuela, conforme o acordo, os demais países da OTAN poderão atacar a Venezuela (se um país membro for atacado, os demais afiliados poderão se envolver no conflito também). A possibilidade de conflito armado é imensa, pois na região de Santander (Colômbia) há centros de treinamento paramilitares financiados pelo Departamento de Estado Norteamericano, conforme denúncia do serviço de inteligência cubano (G2). O serviço de inteligência cubano também alertou sobre a presença de Israel, em Brumadinho, que a mesma não visava ajudar no resgate de vítimas mas sim em fazer um estudo logístico com finalidades belicistas.
         Maduro está fazendo o possível para contornar a crise imposta, pelos EUA, e manter de pé o seu regime. Criou a criptomoeda Petro, uma forma inteligente de sair um pouco deste sistema financeiro atual controlado por grandes bancos físicos, as fintechs tem sido uma ótima alternativa ao sistema financeiro e monetário vigente. Através do Petro, o governo chinês injetou U$$ 750 milhões de dólares na economia venezuelana. Além do Petro, Maduro começa agora um plano  de construção civil chamado "Venezuela Bella" que visa modernizar as cidades venezuelanas. Gerará emprego e renda aos jovens. Além disso tem estreitado laços com países da África e Ásia, como o caso das visitas de autoridades do Gabão, Senegal, Turquia, Gana e Filipinas. Vale lembrar que o Grupo de Lima está contra Maduro, mas o Caricom (bloco econômico com quinze países do Caribe) apoia o governo do presidente venezuelano. O chavismo enfrenta pressão midiática internacional. Ernesto Araújo (Ministro das Relações Exteriores) é um opositor de Maduro e pró-Trump, Iván Duque Márquez está alinhado aos EUA e o Chile possui bases navais americanas instaladas em seu interior como o Fuerte Aguayo em Concón. Na América do Sul, o PSUV recebe o apoio do presidente boliviano Evo Morales e a Itália não reconhece Juan Guaidó como presidente. China e Rússia representam, na ONU, a favor de Maduro e a Turquia tem investido muito nos últimos tempos e isso dá fôlego ao governo. Uns especialistas dizem que o impasse entre os EUA e Venezuela definir-se-á apenas na esfera retórica, como ocorreu com a Coreia do Norte recentemente ou na crise dos mísseis em Cuba (auge da Guerra Fria). A América do Sul não é palco de guerra faz muito tempo, a estabilidade dos seus governos representa uma ameaça ao poderio imperialista  e uma desestabilização dos mesmos facilitaria o controle da região e de suas riquezas.
          A sedução por riqueza fácil, poderá aliciar algum país em desenvolvimento (como o Brasil) a entrar numa arriscada aventura. Uma decisão perigosa que poderá colocar no front de batalha milhares de jovens, causar rombos bilionários aos cofres públicos pois dívida de guerra é imprevisível. Inclusive, sob a perspectiva constitucional, a União poderia instituir o IEG ou Imposto Especial de Guerra que com certeza pesaria no bolso do brasileiro. Um conflito entre Brasil e Venezuela com certeza acabaria com a boa reputação brasileira na América Latina e na ONU, causaria um genocídio fratricida entre povos irmãos, apenas beneficiaria às super potências e a indústria bélica. O rumo das coisas é incerto, Trump deseja se reeleger e a cada dia as pressões internacionais sobre Maduro aumentam. O judiciário, as Forças Armadas e a maioria do povo venezuelano está com o PSUV e não reconhecem Juan Guaidó como presidente legítimo.
        O Governo Venezuelano, sofreu em seu sistema elétrico nacional um ataque cibernético que ocasionou um moroso blecaute que necessitou da cooperação do povo venezuelano até a completa restauração. Mais uma estratégia bélica, do governo Trump, para causar confronto social entre os apoiadores de Maduro e Guaidó.
        As declarações dos filhos do presidente Jair Bolsonaro, junto com seu o temperamento explosivo, tornam o destino da paz muito incerto. Os sinais mostram que uma guerra está em curso, tomara que estejamos errados, principalmente depois da visita surpresa e de "cortesia" de Jair Bolsonaro à CIA (Agência Central de Inteligência) dos Estados Unidos da América. A possibilidade de utilização da Base de Alcântara, no Maranhão, ponto estratégico para lançamento de satélites (com economia considerável de combustível) devido às coordenadas geográficas e relevo, tem causado preocupação em brasileiros e venezuelanos. O que está em jogo é: o imperialismo eurocêntrico e norte americano versus o anti-imperialismo bolivariano apoiado por potências asiáticas (como Rússia e China).
        
     
             

Comentários

  1. Gostei da analise, nao podemos aceitar nosso governo se metendo em uma briga desse tamanho

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